Durante o percurso, o guarda foi fazendo perguntas para
Eduardo. Ele respondia tudo com a maior sinceridade. Dizia que não gostava de
gays e que eles tinham mais é que morrer mesmo. Que estavam atrapalhando a
visão dele e que bateriam neles de novo. Quantas vezes forem necessárias.
Enquanto isso, João ligou para os pais do amigo. A bronca no
menino foi inevitável, já que ele ajudara o amigo a sair do castigo. Ainda
assim, o menino criou coragem e contou para eles o que houve no rodeio. A mãe
de Eduardo ficou impressionada. “Detiveram meu filho só por causa disso?”,
disse ao telefone. Assim, estava explicado o preconceito do filho. Ele fora
educado numa família onde as diferenças nunca eram aceitas. Todos deveriam ser
iguais, seguir uma mesma receita. Mas João não era assim. Apesar de ser
heterossexual, fora criado em um ambiente onde todos se respeitavam, não
importasse a classe social, religião, cor ou orientação sexual. Mas ficou
quieto, não queria queimar mais seu filme com a mãe do melhor amigo.
Finalmente, Eduardo chega à delegacia. Pega o telefone e
liga para casa. Ninguém atendia, certamente já estavam a caminho. “João deve
ter contado para eles. Merda! Tô mais ferrado do que eu pensava”, pensou o
garoto. Não demorou muito para que eles chegassem ao local. A cara de
desaprovação dos pais era certa. Não pelo que ele fez na festa, mas pelo fato
de Eduardo ter os desobedecido. Conversaram com o delegado e, como era menor de
idade, conseguiram levar o filho para casa sem maiores preocupações.
Em casa, os pais têm uma conversa séria com Eduardo. Falam
que estão completamente desapontados com ele, que tenta se explicar. Em vão,
pois eles não deixam que uma simples palavra saia da boca dele. E tomam uma
decisão que mudaria a vida do garoto para sempre: ele iria pra um colégio
interno. Segundo eles, esse era o único jeito de ele colocar mais juízo na
cabeça. Eduardo relutou, relutou, mas de nada podia fazer, os pais já estavam
com a cabeça formada. Ele não imaginava sua vida fora daquele lugar. Vivera sempre
ali. Viajava raramente. Pensou que não ia dar conta. O que seria dele agora?
Como iria viver sem seu futebol? Sem seu skate? Sem as mulheres? Perguntas e
mais perguntas foram pipocando na cabeça. Sem nenhuma resposta consistente. A
sua vida a partir de então era incerta. Parou e pensou. Já estava no primeiro
ano do Ensino Médio. Só teria que aguentar aquele lugar por mais dois anos. E,
depois disso, LIBERDADE! Já seria maior de idade e poderia mandar na própria
vida. Pelo menos era o que pensava ele.
Sua partida estava marcada para o próximo final de semana.
Tinha exatamente uma semana para se despedir de tudo o que o cercou nesses
poucos, mas bem vividos, anos de vida. Nem sabia por onde começar. Decidiu,
pela primeira vez na vida, frequentar corretamente as aulas de seu agora antigo
colégio. Tentou até superar sua raiva e conversar com a ex Ágata, mas não
conseguiu. Era fútil demais aquela menina. Deixou falando sozinha.
Ainda estava chateado com João, pois segundo Eduardo, ele
sozinho daria um jeito de escapar da polícia. Mas, mesmo assim, não sabia
quando veria o melhor amigo mais uma vez. Então, resolveu relevar e fez as
pazes com ele. Não sabia se no novo colégio ele iria ter um amigo como João,
mas acreditava que não. Eram amigos há mais de dez anos. E nesse tempo todo, só
ficaram sem se ver por apenas dois dias. Quando João teve que ir para Belo
Horizonte ver umas primas que estavam morando na Inglaterra e estavam na cidade
para visitar a família. De resto, todos
os outros dias estavam os dois lá, juntos. Quem não os conhecia, podia até
pensar que era um casal de namorados, de tão grudados que eram. Apesar de que
era muito suspeito eles passarem tanto tempo juntos assim.
A semana passou num piscar de olhos. Eduardo já estava com
saudades daquele lugar e daquelas pessoas. Até de sua família ele sentia falta.
Não sabia o que esperar de sua nova escola, de seus novos colegas.
Era sábado e ele precisava ir. Foi até a casa de João para
se despedir do melhor amigo. Estava sozinho, seus pais tinham ido para o mercado.
Deram um longo abraço, um abraço de quem sabe que não vai ver o outro tão cedo.
Então, Eduardo se despediu mais uma vez e, num ímpeto, beijou o amigo na boca.
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